Sobre a frase: “Alguns escritores
preocupam-se em vender livros; já eu prefiro os que escrevem, e só.”, deixe-me contar
uma historinha: uma escritora, esfuziante por ter conseguido
publicar seu primeiro livro, convidou amigos para o evento de lançamento; pouca
gente, pequena recepção. Enquanto autografava os livros, ouviu de alguém:
“Parabéns pelo livro mas escolha outro caminho, poesia não costuma vender”. Ela
conta que nada disse, foi para casa e ficou pensando, pensou muito e ‘cronicou’
o ocorrido depois. Fiquei sabendo do fato por esse escrito e comentei algo assim:
“Menina, pois eu teria dito: poesia não vende?! Graças a Deus! Pois esse é um
bom motivo para se seguir escrevendo, poesia e outros gêneros não atrativos ao
público comum.” Você consegue ver textos literários como produtos? Ainda não
cheguei a esse ponto de ‘evolução’. Será que um dia eu consigo? Ironia, oká?!
segunda-feira, 27 de maio de 2013
sábado, 18 de maio de 2013
sábado, 11 de maio de 2013
Inquietações
Não só minhas, me parece. O escritor
moderno escreve para quem, por que e o quê? Há tantos escrevendo; muitos
descobriram que podiam escrever, senão todos, salvo os analfabetos e os que se
dedicam a outros ramos e funções, e os que não se deixam seduzir ou enganar
pelos apelos da escrita rica ou barata e da certa exposição. Pois que a maioria
que hoje em dia escreve publica na rede, como eu, e talvez, como eu, sinta esse
peso, essa incômoda necessidade (?) de entender algo cuja compreensão quiçá não
seja dada a esta geração, pois carecemos de tempo. Uma busca por ser lido por
quem, quando, como e por quê? Ser lido simplesmente? Que a leitura em voz alta
anda muito em baixa, ou que certos textos quase não recebem vistas, e se as
recebem não-atentas são ou não estão de fato interessadas em ler a arte por
trás, se existe. Nossa, nesse mundo de tantos contatos, tentar acompanhar uns
poucos é mais sensato do que esforçar-se para não seguir a muitos por ventura
nenhum dos cem milhões à frente e ao lado, já que ninguém segue quem está
atrás. Mas quem parece estar atrás pode bem estar à frente, disfarçando que
segue o seguido que não percebe a perseguição. Porém disse Maurem Kayna: “toda
declaração pública dada por um artista, não importa o segmento, nunca é completamente
sincera. O grande público, aliás não tem predileção pela sinceridade, mas pelo
efeito.” E que mostrar o coração é um erro, já dizia Oscar Wilde. Quanto será
que vale um pensamento, um desses impulsivos que o dono não filtrou? A
sinceridade pesa demais e é um fardo que todo sábio escritor, se quer ser lido,
deve eliminar quão cedo melhor que antes. Nunca se escreveu tanto e nunca foi
tão difícil ser ouvido. Onde está o leitor, quem é ele? Toda vez que debocham
de um texto, um texto novo surge em seu lugar e assim vão seguindo, juntos, sem
saber onde e como parar, e se o querem: o texto ou seu autor. O que escrevemos?
Há os que escrevem efeitos, e os que escrevem só para causá-los. Há quem
escreva feitos alheios e prefere esconder as vidas nos trabalhos. Sim, esta
frase é de um ator brasileiro, Selton Mello, li num jornal: “Quem fala da vida
pessoal não tem trabalho para mostrar”. Isso soa complicado, pois literatura é
um produto da vida, de vidas e por vidas, sem o ser humano e seu cotidiano não
vejo como ela possa existir. E que não se deve ter nada para falar ao fazer
literatura, concordo e isso me disse Kafka. Seria a literatura algo divino? Não
creio, o que é do homem o bicho não lê nem escrevem os deuses, não penso em
esperar qualquer passagem para saber se me enganei correndo ainda o risco de
descobrir e logo em seguida ter que esquecer sem poder passar adiante, já que o
velho bom senso dita que não fala
nem volta quem já morreu. Até isso é duvidoso, não entro numa nessa questão.
Viver é perigoso, escrever sobre a vida é escolha insana e pouco produtiva,
arrisco dizer. Escrever de verdade é algo que não traz glamour, só trabalho e
revisão. E que não se deve confiar num escritor, disse-me Érica Jong. Quando o
ruído ameaça enlouquecer pela falta do silêncio, melhor a fazer é calar, dar um
tempo e ver como as letras se encaixam-organizam, deixar a vida seguir com
sinceridade, com feitos e sem efeitos não naturais. Creio que o desafio do
escritor moderno, aquele que publica de forma gratuita e independente na
internet e é comprometido com a arte literária e com o seu tempo, está
justamente em saber lidar com essa sobrecarga de informações, papéis e ruídos,
e daí fabricar o sossego necessário, porém fictício, para extrair de tudo isto
algo capaz de resistir à passagem das gerações. E viva o ruído (êh?!) porque
paz para escrever há muito já se foi.
Comentário de Maurem Kayna para este texto, via email:
"Talvez uma parte do equívoco esteja em esperar com a produção possível no presente as glórias que figuras do passado obtiveram. O resultado viável hoje é, possivelmente, proporcional ao tipo de criação desse tempo e receio que a posteridade não seja compatível com ele (esse nosso tempo). Mas também essa impressão pode estar errada. "
quarta-feira, 8 de maio de 2013
quarta-feira, 1 de maio de 2013
A Cidade dos Sete Mares – Victor Eustaquio
Este livro, desde o primeiro parágrafo
lido o meu desejo foi seguir, mas a vida obriga a pausas e a primeira leitura
acabou sendo muito fragmentada, porém instigante, empolgante e prazerosa até o
final.
A narrativa flui, envolve e pareceu-me
muito bem construída, além de trazer questões que exigem do leitor. Diria que é
uma mistura de ensaio filosófico e jornalismo entregue com admirável
competência literária. Várias passagens e descrições estão carregadas de lirismo,
ao mesmo tempo que informam, questionam ou causam grande incômodo, o que se
espera aliás de bons textos, aqueles que não se propõem unicamente a oferecer
uma leitura ‘gozosa’ no sentido mais pobre que essa experiência possa ter —
para o leitor que busca tão somente o vazio entretenimento, digo — porém um
texto escrito artisticamente e que impulsiona, provoca o diálogo e o pensamento
— o que se chama arte de narrar, não é mesmo? Bom, há muitos exemplos por todo
o livro, detenho-me a citar o modo sutil (perspicaz) como o autor termina os
capítulos IX e XII. Quando falei em ensaio, fí-lo por ter-me lembrado de uma
declaração de Saramago, certa vez. Ele cogitou a possibilidade de ter sido um
ensaísta frustrado que usava o romance como forma de expressão. Não que seja
esse o caso em A Cidade, apenas compartilho a
idéia a que esta característica deste texto me levou. Ai mago Sará...
saudade.
Interessante o uso que o autor fez do
Web fórum neste livro. Dentre autores contemporâneos que tenho lido, alguns que
costumam criticar pós-modernismos mas não abrem mão da experimentação, ainda
não havia visto o bom uso de um recurso tão à mão quanto comentários soltos
pela Web.
A qualidade narrativa no primeiro
capítulo livrou-me da leve tentação de querer desistir da leitura ao chegar no
segundo capítulo, quando pensei: “Ih, começou a degringolar. Estava bom
demais para ser verdade...” Mas simplesmente não
pude crer que um autor que tão bem se saíra nas primeiras páginas tivesse
perdido a mão, assim, do nada, uma oportunidade ímpar de fisgar o leitor. Segui
a leitura. Sábia decisão.
As peças do enredo vão sendo coladas
pelo planejado uso da repetição, que não aborrece — do que mesmo estamos a
falar? Que história estou contando, percebes? Descrições
e acontecimentos estão bem equilibrados, o que dá uma boa dinâmica ao texto e
faz o leitor desejar o próximo capítulo e o desfecho num crescendo de
excitação. Recordo de um pequeno trecho só, durante a leitura, em que o tédio
ameaçou achegar-se, porém ele não resistiu muito tempo e calado como veio,
quieto se retirou.
O protagonista intriga por duvidar da
própria memória e passar “a vida a tentar contactar pessoas que se haviam
perdido no passado”, tomando mentiras por verdade e verdades como mentira, o
que fazemos todos nós. A exploração do sexo para mim soou como uma tentativa de
tirar de foco as verdadeiras histórias: as torpezas humanas, os crimes do mundo
e da vida, bem como a busca eterna por respostas. Será possível escrever bem
sem uma total entrega? — Faço-me esta pergunta desde o primeiro post que
publiquei.
Talvez alguns leitores recepcionem o
sexo como vulgar, já eu acho que eufemismos e o político-corretismo nada mais
são do que percalços no caminho de quem escreve com autenticidade e paixão.
Figuras, metáforas... punições, a história de um crime, de vários crimes, uma
história dessas de todos nós, universal.
“as
verdades que se desabafam são universais, pelo que a todos tocam, ou a quase
todos, mesmo os que não comentam mas só observam, e lêem, e pensam, era mesmo isto
que eu queria dizer, era mesmo isto que eu estava a sentir, mas discordo, os
amigos são falsos e a Internet só serve para ampliar o jogo do quarto escuro,
não há ninguém que acenda a luz, porque convém, como as cortinas e os
compartimentos que separam os penitentes em confissão e os sacerdotes de Deus,
a santidade do sacramento assim o dita, o sacramento da reconciliação para tudo
o que é irreconciliável.”
E o final é como a vida: algumas coisas se encaixam, outras permanecem
sem explicação mas fascinam e atiçam o desejo de recomeçar e seguir. E é bom
que assim seja, para quem gosta de entrelinhas e persegue os sete mares, pois como bem me disse o texto:
os romanos, sem os gregos, teriam existido jamais. Quem sabe?
Resumo: um texto que me proporcionou uma leitura instigante, empolgante e
prazerosa até o final. Trata-se de um romance para mentes adultas, acostumadas
à arte literária e ao exercício de pensar. É o que eu chamaria de 'ficção
crítico produtiva', um texto para ser lido, relido e degustado, e que bem
retrata velhas e novas angústias, angústias eternas humanas, de todos nós.
Parabéns, Eustaquio. Recomendo e vou reler.
Ficha:
Título: A Cidade dos Sete Mares (Free Edition),
Autor: Victor Eustaquio
Gênero: romance, ficção
Ano: 2012.
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