sábado, 22 de janeiro de 2011

Por que criticar o português da mídia


Boa pergunta, uma que não havia me feito ainda, e que uma colega (pessoa que eu considero e respeito muito, aliás) me colocou em forma de comentário para o texto ‘Críticas ao português dos jornais no Brasil’, publicado hoje cedo. Entendo que seu comentário relaciona-se a textos de pessoas comuns — ou amadores, como eu também me defino no ramo literário. O meu artigo, entretanto, refere-se a textos escritos por ditos profissionais da área (professores, jornalistas, escritores, etc.).

Considerando a recente tragédia dos deslizamentos de terra no Brasil, e a situação do brasileiro em geral, concordo que há coisas (e sempre haverá!) muito mais importantes do que ficar questionando erros de português nos meios de comunicação. Ainda mais se o objetivo final é comunicar, e no final todo mundo sempre se entende! Pra quê gastar energia com esta questão?

Começo pela possível ‘audiência'. Escrevi o texto anterior pensando nos pseudo-profissionais que escrevem para muitos jornais ou redações de programas de TV. É muito pouco provável que meu artigo seja sequer lido por qualquer desses indivíduos. Por outro lado, escrevi também pensando nos professores dos meus sobrinhos e filhos de amigos que vivem no Brasil. É bem capaz que muitos desses professores, maioria da rede pública, tenham blogs ou até mesmo escrevam aqui no Recanto.

Pela péssima qualidade de textos publicados por muitos que se declaram professores (e de português!), é natural que eu pense no futuro dos meus sobrinhos e filhos de amigos, os quais são alunos de escolas públicas ou de escolas particulares de qualidade questionável. Não sou mais tão ingênua a ponto de não duvidar da formação dos professores dessa clientela. Esses, exatamente por, talvez, nunca terem tido questionada sua competência na própria língua, é exatamente nos meios de comunicação que vão buscar modelos para usar em sala de aula.

Minha sobrinha mais velha manifestou, certa vez, o desejo de vir passar um tempo comigo, na Alemanha, e estudar por aqui. Imagine como fica o coração de uma tia tendo que olhar para a sobrinha que ama e dizer: “Meu Deus, minha filha, com esse português chinfrim que você tem, não vai dar pra aprender alemão não... Vai ser um massacre!”. É triste, mas é a realidade. E como não sou do tipo que alimenta falsas esperanças, tenho que dizer a verdade, doa a quem doer.

Pensando nessas prováveis vítimas, escrevi o artigo anterior. Depois que o publiquei, senti-me como um pregador no deserto ou como estar cantando para bêbados — uma característica que odeio em mim e estou lutando para mudar. Pra quê então questionar tudo isso? Talvez eu esteja com mania de primeiro mundo: não me falta comida, teto, transporte de boa qualidade, saúde, educação, em suma: toda a dignidade que uma pessoa necessita pra viver. Pra quê então ficar me preocupando com gente que não tem nada disso, e que, talvez, esteja tendo negada a única chance de mudar de vida, ou seja: o direito a ter uma boa formação, coisa que, até me provarem o contrario, estou mais do que convencida: começa pelo domínio da própria língua.

Vai ver é porque, mesmo estando tão longe, continuo brasileira...

Ah, por favor não interprete esta minha crônica como uma resposta. Trata-se muito mais de continuar refletindo sobre o tema e a pergunta, que eu achei muito boa aliás, realmente me motivou: 'Por que, né?' No dia em que não puder mais questionar as coisas ao meu redor, tenha certeza: pode mandar enterrar que estou morta!


Um abraço fraterno.

Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 22/01/2011
Código do texto: T2745118



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Crítica ao português dos jornais no Brasil


Sábado passado, publiquei um texto no qual chamava a atenção para alguns erros de português num artigo de jornal. E num jornal de escopo nacional, diga-se de passagem.

Não sou purista e não sou de criticar pessoas só porque escrevem errado, ainda mais porque minha escrita não está livre de erros: não tenho ninguém para revisar o que escrevo, vivo fora do Brasil há alguns anos e estou constantemente sob a influência de várias outras línguas.

No caso de um jornal, no entanto, por ser um meio de comunicação nacional, e que certamente poderá ser usado por algum iniciante como modelo de ‘boa’ escrita, bom, nesse caso não pude me calar, pois quem cala consente e com tal coisa não posso compactuar.

Não sei você, caro leitor/a, porém EU espero que as pessoas que escrevem para um ‘grande’ jornal sejam, no mínimo, profissionais, e se não o forem, há muito o que se desconfiar da qualidade do produto. Um escritor ou jornalista que não domina o seu instrumento de trabalho, a língua na qual escreve, não é digno de respeito, confiabilidade e consideração por parte do leitor.

Alguns poderão julgar-me radical neste ponto; não me importo. No tocante a profissionalismo é assim que eu penso: alguém é profissional ou não é, dispensando o uso de ‘bom’ ou ‘mau’ para rotular.

Pois bem, a maioria das pessoas que escreve hoje na internet, incluindo eu, são cidadãos comuns — está certo que há psicopatas também; é preciso aprender a reconhecê-los para mantê-los à distância e denunciá-los à sociedade se forem perigosos. — Sim, mas deixando os perturbados para lá, as pessoas comuns, creio eu, não esperam servir de modelo de escrita nem deveriam ser tomados como tal, o que não significa que devam descuidar do português.

Erros ‘aceitáveis’ em textos de ‘amadores’, que muitas vezes representam o ‘falar comum’ em contextos informais, não devem ser tolerados em textos escritos por ‘profissionais’ em contextos sérios ou formais. Daí a razão da minha crítica aos jornais.

É triste ver o que tem ocorrido com o português do Brasil. Basta prestar um pouco de atenção na confusão que se vê na mistura do uso de pronomes ‘tu’ e ‘você’ pra se ter uma idéia do quanto a mídia influencia mal o ‘desenvolvimento’ da língua.

Outras línguas sofrem do mesmo problema — o italiano moderno, por exemplo, porém a questão aí é outra, dado a variedade de dialetos históricos da região. No caso do espanhol/castellano, resta ainda uma certa ordem — muitos espanhóis usam corretamente ‘tu’ e ‘vosotros’, o que há muitos anos parece já ter sido abolido no português do Brasil. Pelo menos é o se lê nos livros de português para estrangeiros que tenho encontrado por aqui.

Com o passar do tempo, a tendência é  que normalizem os fenômenos lingüísticos típicos de cada região, a exemplo do chamado ‘voseo’ latino-americano, resultado da mistura de pronomes ‘tu’ e ‘usted’ (você) e outras características mais, algo semelhante ao que se vê hoje em muitas variantes do português no Brasil.

No meu tempo de escola fundamental, lembro bem que a professora costumava dizer: “Agente não faz nada, nós fazemos!”. Hoje em dia é mais fácil “aprender japonês em braile” do que tirar o ‘agente vamos’ do repertório nacional.

Como já disse, não sou purista, porém acho que nós que escrevemos, amadores ou profissionais, deveríamos ter mais consciência de como podemos estar contribuindo, bem ou mal, para o desenvolvimento de nossa língua. Quem ama, cuida, preserva, e pensa nas futuras gerações.


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Se deseja reproduzir este texto no todo ou em parte, favor respeitar a licença de uso e os direitos autorais. Muito obrigada.

Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 22/01/2011
Código do texto: T2744797

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sábado, 15 de janeiro de 2011

Assim 'evoluem' as línguas

Foto: HFrenzel 2006


... pelo menos para desespero dos que pensam ainda saber ler!


Eis aqui algumas frases retiradas de um texto jornalístico atribuído a ‘O Globo’, o qual tive hoje a curiosidade de ler na internet:

"Outra coisa que chamou a atenção dos presentes é que as ministras mulheres falaram mais que os colegas homens."

Por acaso há ‘ministras’ homens? E nem precisa ser especialista em português pra perceber que alguma coisa está sobrando nesta frase. Êh, pleonasmo, dá neles!

Outra pérola, e no mesmo texto:

"Palocci entregou a todos uma pasta com cópias de todas as leis que regem o serviço público e visam a garantir a moralidade na gestão pública."

Esse emprego do verbo 'visar' me incomodou. Não sou especialista em português, mas penso que o correto seria 'visar algo', não? Ou seja: ter algo por objetivo. Portanto, ‘visam garantir a moralidade na gestão pública’ e pá-pá-pá. Permita-me aqui uma gargalhada de escárnio no tocante ao uso do termo ‘moralidade’ por alguém da classe política. Políticos contemporâneos desconhecem o significado desta palavra, assim é incoerente utilizá-la.

Quanto ao uso do termo ‘presidente’, pelo menos nisto acertaram: "Como agora temos uma mulher presidente ..."

O sufixo ‘-ente’, se não me atropela a própria ignorância, significa 'aquele/a que é, o ser', ou seja: independe do gênero. Por exemplo: o/a presidente é o ser que preside, o/a dirigente é o ser que dirige, o/a gerente é quem gerencia. Nesse ponto, espero que não venham nos próximos anos querer imitar os espanhóis, que passaram a aceitar o termo ‘presidenta’ justificando evitar o sexismo lingüístico (tsc-tsc-tsc...)

Penso que discriminação (de qualquer tipo) não seja algo inerente às línguas, e sim às pessoas que as usam. Bem, mas este já é outro tema.

Bom, como ‘moralidade’ há muito não está mais associada a políticos, o mesmo está ocorrendo com o par (se antes junto, agora litigiosamente separado) ‘jornalista’ e ‘saber escrever’.

E o pior: textos como este do jornal geralmente são usados por muitos como 'modelo para copiar'. Eu, hein?!

Assim ‘involuem’ as línguas, né não? E esse meu erro foi proposital :-)

Um abraço fraterno.


Ah, conscientemente ignoro o recente acordo ortográfico. Lingüística vai morrer comigo assim, 'tremendo no u'!


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Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 15/01/2011
Código do texto: T2730758


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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Antologias


Incrível a quantidade de ofertas que se recebe a cada dia nesta tal de Internet, principalmente nesse mundo literário. Não sei você, mas eu desconfio seriamente de certos convites.

Na minha ignorância ‘letrária’, sempre achei que editores, via de regra, pagam a seus autores para que escrevam, e não o contrário: um autor ter que pagar para ser publicado.

Tendo certa noção das dificuldades no mercado editorial, e sabendo que há exceções — raras, porém há —, o novo nicho das antologias me parece isca perfeita para pegar incautos vários, gente humilde que sonha em ver seus escritos publicados e não titubearia em investir suadas economias para tal.

Para depois não se ver tendo que chorar o leite derramado, sempre é bom ter cuidado, não?

Quando a esmola é muita, não sei você — muito menos o santo! —, mas eu desconfiaria...
Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 12/01/2011
Código do texto: T2725003


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domingo, 9 de janeiro de 2011

Cama, discussões e 'otras cositas más'


“Para ela a vida girava em torno de uma cama.”

Perde tempo quem prossegue a leitura esperando encontrar aqui alguma coisa erótica. Está certo que esta é uma das associações adultas mais freqüentes à palavra 'cama'. Confesso que foi essa também minha primeira idéia ao ler tal frase, ainda mais porque se referia à pintora mexicana Frida Kahlo, uma de minhas preferidas, diga-se de passagem. E Rosa Montero, em suas Histórias de Mulheres, foi a autora de trocadilho tão, digamos assim, safado... ops!! quis dizer pensado, bem-pensado!

Rosa Montero é colunista de El País e por isso mesmo deve conhecer muito bem as estratégias para pescar leitores. Embora a tenha lido há mais de três anos, amanheci outro dia com a dita frase na cabeça. Lembrei de uma pequena discussão que tive com uma menina sobre a classificação das obras de Frida como surrealistas — uso ‘menina’ só por ela ser muito mais jovem do que eu, nada pejorativo.

Lembrei a ela, à menina, que independente de como os estudiosos de arte classificarem sua obra, hoje ou naquela época, Frida dizia que eram resultado do que via e sentia, e de olhos bem abertos, e não de coisas do inconsciente, uma das marcas d`água do chamado surrealismo de André Bretton, Salvador Dalí e outros considerados surrealistas. “Não se trata de discutir classificação”, disse-lhe, “e sim de lembrar o que disseram os artistas mesmos sobre suas obras”.

Discussões vãs, evito ir por esses pântanos. Em verdade, o que não é fato comprovado, é pura crença ou opinião. Quem sabe, mais adiante, eu venha a ensaiar uma análise buscando argumentos que fundamentem essa minha opinião sobre a obra de Frida. Não por disputas tolas, claro, muito mais pelo prazer de ocupar-me com alguém que admiro.

Na vida, assim como na ciência, é sinal de loucura ou imaturidade sair por aí repetindo teses próprias ou alheias sem antes havê-las sequer tentado comprovar. Tem gente (graças a Deus) que não vai engolindo logo tudo o que ouve, e sim que reflete, questiona e fundamenta suas idéias antes de soltá-las por aí. E neste ponto, penso eu, tropeçam e caem muitos inexperientes.

Ao ver alguém caminhando em direção a um abismo, sinto-me na obrigação de pelo menos avisar do perigo. Alegria pelo fracasso alheio é veneno para o próprio coração, e para ficar em paz com a minha própria consciência, tento manter afastada a couraça da arrogância —  muito comum no meio empresarial e acadêmico —, e tento dizer, em claro e bom tom: “Ei, tem um abismo enorme bem ali à sua frente”.

Se a pessoa se faz de surda, seja por insegurança ou imbecilidade, fazer o quê, não? Por falta de aviso ou não, quedas são parte da vida. Se sobrevivemos a elas, e conseguimos tirar algo positivo, tornamo-nos muito mais fortes. Fabulosos os mecanismos que a mestra vida usa para nos educar!

Como está na moda dizer que TUDO foi a Evolução que nos ensinou — Terá sido mesmo? —, e estando eu insegura sobre isso, não posso afirmar que a Evolução nos ensinou a ter CUI-DA-DO. Essa palavra, agora, me soa de modo bem especial, pois associei-a a uma anedota que García Márquez contou num evento.

Disse que, ainda garoto, ia tranquilamente pela rua quando um padre, do outro lado, vendo que ele estava a ponto de ser atropelado por um homem que vinha em uma bicicleta, gritou: “CUIDADO!!”. O homem levou um susto tão grande que caiu da bicicleta, livrando o menino do atropelamento quase-certo. O padre, então, gritou para o garoto: “Você sabe o poder que tem a palavra?” E García Márquez concluiu a anedota dizendo: “Naquele dia eu soube!”.

Adoro histórias deste tipo. São tão puras, simples, e têm uma força capaz de passar por séculos sem perder a vitalidade e a magia. E com CUIDADO, penso que, quando alguém tem uma crítica a fazer (construtiva, claro) só deve externá-la se tiver pelo menos um fundamento.

Já aconteceu de alguém chegar pra mim e dizer que não entendeu algo que eu disse ou escrevi, coisa perfeitamente normal. Fugindo do princípio Quintaniano que prega “Se alguém não entende um texto, um dos dois é burro: quem leu ou quem escreveu”, minha tendência natural tem sido sempre perguntar à pessoa o quê especificamente ela não entendeu.

Venhamos e convenhamos, para que um diálogo continue, necessária é a condição que venha uma resposta do outro lado. Não vindo pois qualquer manifestação, só resta ao autor fazer como Pilatos e lavar as mãos do sangue de (inocentes?!) interpretações.

Sim, e a cama? Onde entra a cama em tudo isso? Ler na cama é bom, desde que não sejam leituras que nos roubem o sono. Sim, Rosa Montero joga com essa idéia de que, para Frida, a vida girava em torno de uma cama pelos vários anos em que ali viveu, e morreu, por conta de um acidente que lhe marcou profundamente. Talvez sua obra não tivesse nascido se ela não tivesse sido condenada à prisão da cama. E nessa prisão, paradoxalmente, Frida sentiu-se livre para soltar as amarras de seu pensamento, perdendo (talvez) o medo de experimentar.

Numa cama, Frida passou muitos anos de sua vida. E eu estive presa a uma por poucos dias só. Já faz tempo. Poucos sim, mas que valeram por todos os outros vividos até ali; dias em que tive que me colocar no lugar de pessoas que têm uma cama como morada fixa; dias em que tive que reaprender o básico do básico; dias de recomeço.

Não sei se numa cama me conceberam — isto também não importa aqui, Helena! —, mas numa cama de maternidade nasci, e numa de UTI re-nas-ci. E é por isso que em janeiro passei também a comemorar aniversário: o renascimento que a cama me trouxe, uma nova percepção das pessoas, e da vida. Um desejo de fazer novo, tudo, tudo de novo e muito melhor.



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Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 09/01/2011
Código do texto: T2718469


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sábado, 8 de janeiro de 2011

Nadismo de novo


No meu texto anterior, comentei sobre o nadismo, ou seja: uma tentativa de conscientemente ‘fazer nada’ por um certo período do dia. Depois, pensando melhor, vejo que o colega José Cláudio tem razão em seu questionamento de que até mesmo ‘fazer nada’ seria já estar fazendo alguma coisa.

Esse parece ser o argumento por trás do velho ‘deitado’ que diz: “Quem cala, consente”. E pensando mais seriamente ainda, dado que não consigo parar meus pensamentos, constato que não sou realmente capaz de ficar ‘fazendo absolutamente nada’ em qualquer momento. Até mesmo quando dormimos, sonhamos (ainda que não nos lembremos dos sonhos ao acordar), o que sugere que não só o tempo não se consegue parar, a mente também não.

O que podemos fazer é, no máximo, tentar desligar, por vezes, do mundo, da passagem do tempo e do trabalho contínuo da mente. Assim sendo, ‘fazer nada’ seria só uma tentativa de não se permanecer 'conectado' o tempo todo, e sem culpa alguma por se ter 'interrompido a conexão'.

Hoje, por exemplo, o dia amanheceu lindíssimo! Um sopro primaveril bem no meio do inverno, um presente dos céus pra quem vivenciou o ‘inferno’ da neve no final de ano por aqui. Um presente dos céus sim, mas não para os que estão sob a ameaça de enchentes.

Bom, a temperatura subiu (hoje tivemos 13 graus Celsius),  o sol saiu, a neve derreteu e os rios não param de subir. Onde vivo, provavelmente não seremos atingidos por cheias, o que não me livrou de, durante um passeio que fiz hoje pelo bosque, pensar nas prováveis vítimas.

Aliás, caminhadas assim são uma excelente forma de tentar ‘fazer nada’: só eu e natureza, a natureza e eu, e de vez em quando alguns passantes que tiveram também a mesma idéia. Claro que quando faz bom tempo por aqui todo mundo quer aproveitar, é justo! E justo hoje, num sábado, “caiu a sopa no mel”, quero dizer: “juntou-se a fome com a vontade de comer”.

Tentar entrar em contato com a natureza é uma excelente chance de treinar esses 'desligamentos' voluntários das coisas materiais. De quebra, ar puro e movimento, cientificamente comprovado, só faz bem ao corpo, à mente e ao coração.


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Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 08/01/2011
Código do texto: T2717005


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quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Nadismo


Aprender a parar no tempo é fundamental



Veja só, há anos sou praticante do nadismo sem saber. Nadismo?! Mais um termo moderno, a exemplo de bullying e cia, cunhado por novos autores para uma velha e intuitiva idéia praticada já há séculos — Leia-se Elogio ao Ócio de Bertrand Russel e O Ócio Criativo de Domenico De Masi, só pra citar alguns.

Nadismo, pelo que entendi do pouco que me inteirei (há pouco) sobre o assunto, através de matérias e vídeos na internet, consiste em reunir um grupo de pessoas para ‘fazer ABSOLUTAMENTE nada’ por pelo menos quinze minutos do dia. Naturalmente se pode ‘fazer nada’ também sozinho, mas em grupo parece que a coisa chama mais a atenção, ou simplesmente dá mais prazer, sei lá.

Lá pelos idos de mil novecentos e carne de porco, minha amiga Isabel costumava convidar os amigos para ‘fazer nada juntos’ na casa dela ou em qualquer outro lugar; uma prova de que o nadismo parece ser uma reação bem natural ao crescente ritmo das últimas décadas.

Como sugere o educador Richard Gerver numa entrevista para a Rádio e Televisão Espanhola (rtve.es), mudanças sempre ocorreram, porém não da forma exponencial que vivenciamos nas últimas décadas, quando ninguém mais — falo de seres humanos medianos normais — tem tempo para assimilá-las.

Basicamente, eis o que faço: mesmo diante do estresse inevitável, já que o tempo não pára e as contas vencem, aprendi a ‘parar no tempo’ de vez em quando, nem que seja só por cinco minutos diários. Na verdade, costumo praticar muito mais, uns 15 minutos, tempo de ouvir pelo menos umas três canções num tocador de CDs  — CD?! Vixe, que coisa mais antiga, não? Pois é...

E nesse meio-tempo fui desenvolvendo termômetros que me indicam a hora de fazer uma pausa. Por exemplo: quando não consigo mais conversar, ouvir, pintar, ou escrever só por escrever — porque o prazer é sufocado pelas tantas obrigações —. Numa hora dessas me alegro por não ser profissional da escrita, digo: jornalista, colunista diabo-a-quatro-que-sobreviva-só-de-escrever. No entanto, meu trabalho exige que eu pesquise e escreva muito, em várias línguas. Nada se compara à satisfação de ver um trabalho importante pronto e publicado, lógico, mas essa atividade fatiga também.

Por isso, nas minhas horas de fazer nada, faço nada MESMO e não tenho o menor sentimento de culpa em deixar tudo pra depois: emails e telefonemas ‘urgentes’, coisas ‘imprescindíveis’ que ‘tenho que fazer’, sair pra comprar alguma coisa ‘indispensável’ — “What you don’t have you don’t need it now”, obrigada U2! —, etc., etc., e etcétera. De fato, ninguém é ‘imprescindível’. Quando não estivermos mais aqui o mundo continuará perfeitamente, provalmente até melhor: sem nós.  E não  ‘temos’ que fazer nada, pois até o ‘fazer nada’ podemos escolher não fazer.

E sabe o que tenho colhido de tudo isso? Continuo surfando nas loucas ondas do mundo contemporâneo, o que é impossível evitar, porém  levo hoje uma vida menos complicada, com menos cobranças, mais saudável, mais desapegada das coisas materiais, com muito mais prazer e muitíssimo menos estresse.

Ou seja: essa bobagem de ‘fazer nada’ de vez em quando funciona sim, basta querer e saber implementar.

Mais sobre nadismo aqui.


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Helena Frenzel
Publicado no Recanto das Letras em 05/01/2011
Código do texto: T2711371


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domingo, 2 de janeiro de 2011

Lanzarote, Ilhas Canárias

Algumas 'facetas' dessa ilha enigmática que tanto me cativou:

A Lanzarote dos cactus, tanto belos quanto diversos





A Lanzarote dos 'recantos' e da arte de César Manrique


(Jameos del Agua)


(Fundação César Manrique)


A Lanzarote da arte 'selvagem' e precisa dos vulcões


(Cueva de Los Verdes: "Espelho, espelho meu...")


(Cueva de Los Verdes: "Vai um concerto aí a 50m abaixo da terra? Acústica ideal!"


(El Golfo: quando a cratera de um vulcão se encontra com o mar)

Da culinária com 'sabor' todo especial 


("Vai um franguinho aí assado na brasa de vulcão?")

Das praias que tão cedo não esquecerei



Muito menos da escassa vegetação


E do jeito 'lanzaroteño' de cultivar uvas para o vinho


A Lanzarote de tudo isso e muito mais que não quis fotografar - para não 'aprisionar' a alma de uma beleza tão especial - deixo aqui como um testemunho às futuras gerações. 

Quem ama a vida e a natureza, preserva; o resto é blá-blá-blá.